Por Que Alguns Filmes São Roteirizados para Incluir Protagonistas Imperfeitos?
Introdução
Os filmes têm o poder de nos transportar para realidades fantásticas, onde heróis, vilões e figuras extraordinárias dominam as narrativas. Contudo, ao longo das últimas décadas, o cinema tem se aproximado cada vez mais da realidade ao retratar protagonistas imperfeitos. Isso não se trata apenas de personagens com falhas, mas de figuras humanas, com suas complexidades emocionais, fraquezas e limitações. Mas por que tantos roteiros escolhem um protagonista imperfeito? Por que optar por uma narrativa onde a imperfeição é o centro da história?
A escolha de criar protagonistas imperfeitos vai muito além de uma simples tendência ou modismo. Este estilo de escrita tem raízes profundas na evolução do cinema e nas transformações culturais e sociais que moldaram a forma como consumimos arte e entretenimento. Neste artigo, vamos explorar as razões que fazem com que filmes sejam roteirizados para incluir protagonistas imperfeitos, quais os benefícios dessa escolha para as histórias, como isso impacta a audiência e quais exemplos marcantes ilustram essas abordagens.
1. O Apelo da Imperfeição: Conectando-se com a Realidade
A primeira razão fundamental para incluir protagonistas imperfeitos é a conexão imediata com o público. Quando o personagem principal tem falhas e enfrenta dificuldades, ele se torna mais humano e identificável. No passado, muitos heróis do cinema eram figuras intocáveis, quase deuses, como os super-heróis dos quadrinhos. Estes heróis possuíam qualidades sobrenaturais ou características que os distanciavam do espectador comum. No entanto, com o tempo, as pessoas começaram a buscar algo mais tangível e relacionável, e é aí que entra a escolha pela imperfeição.
Protagonistas imperfeitos oferecem uma representação mais fiel da vida real. Eles falham, caem, aprendem e evoluem, algo que todos podem entender, pois é parte da experiência humana. Essa evolução e a luta contra suas falhas tornam a jornada do protagonista mais atraente e mais realista.
2. A Falta de Perfeição Como Ferramenta Dramática
Uma das principais funções de um protagonista imperfeito é permitir que a narrativa se desenvolva de maneira mais interessante e multifacetada. O conceito de “imperfeição” serve como uma poderosa ferramenta dramática. Personagens imperfeitos enfrentam conflitos internos e externos que os forçam a crescer e a tomar decisões difíceis. Ao longo do filme, o público observa o protagonista evoluir, aprender com os erros e superar desafios, criando uma narrativa rica e envolvente.
No cinema contemporâneo, isso muitas vezes se traduz em dilemas morais, conflitos familiares ou escolhas de vida complicadas. As imperfeições do personagem se tornam o motor da história, criando momentos de tensão, dúvida e, muitas vezes, até comédia, dependendo da direção tomada pelo filme. O crescimento do personagem e o arco narrativo baseado nas suas falhas tornam-se, portanto, um dos maiores atrativos.
3. A Humanização do Herói: Protagonistas Que Não São Perfeitos
Outra razão importante para a escolha de protagonistas imperfeitos é a tendência de humanizar o herói. Filmes como “O Lobo de Wall Street” (2013) ou “Coringa” (2019) apresentam personagens centrais que, embora muitas vezes profundamente flawed, são absolutamente fascinantes porque refletem aspectos da sociedade e das próprias lutas do público.
Esses personagens não são apenas heróis ou vilões típicos. Eles são multidimensionais, com histórias complexas que exploram os aspectos mais sombrios e, às vezes, até patológicos da condição humana. A partir disso, o público não apenas se vê neles, mas também questiona suas próprias crenças, atitudes e comportamentos.
No caso de filmes como “O Lobo de Wall Street“, o protagonista Jordan Belfort, interpretado por Leonardo DiCaprio, é um exemplo clássico de um personagem cujas falhas – ambição desmedida, ganância e falta de ética – são simultaneamente cativantes e condenáveis. Ele é um exemplo do que muitos podem considerar uma antítese do herói tradicional, mas ao mesmo tempo, sua jornada é tão envolvente porque explora os limites da moralidade e as consequências de suas escolhas.
4. O Protagonista Imperfeito Reflete a Diversidade Humana
Na atualidade, a representação de diversidade no cinema tornou-se uma questão fundamental. O que muitos filmes com protagonistas imperfeitos fazem de forma brilhante é mostrar a variedade de experiências humanas. Ao retratar personagens imperfeitos, filmes podem explorar questões de classe social, gênero, etnia, orientação sexual, e até saúde mental, de uma forma mais autêntica.
Um bom exemplo disso pode ser visto em “Moonlight: Sob a Luz do Luar” (2016), onde o protagonista, Chiron, enfrenta várias dificuldades ao longo de sua vida. Sua jornada é marcada por questões de identidade, luta contra preconceitos e questões emocionais profundas. Sua imperfeição, em certo sentido, é um reflexo da luta constante de muitas pessoas que buscam o entendimento de si mesmas em uma sociedade muitas vezes difícil e hostil.
Ao fazer isso, o cinema não só humaniza seus personagens, mas também transmite uma mensagem poderosa sobre aceitação e a complexidade da experiência humana.
5. A Falha Como Rumo ao Crescimento: Arcos Narrativos Ricos
Uma das maiores vantagens de roteirizar protagonistas imperfeitos é que isso permite o desenvolvimento de arcos narrativos ricos e profundos. Filmes como “O Vingador do Futuro” (2012) e “Her” (2013) mostram como personagens que começam com falhas podem crescer, se redimir ou simplesmente aprender a aceitar suas imperfeições.
A evolução do personagem em filmes com protagonistas imperfeitos frequentemente segue um caminho de redenção ou autodescoberta. O filme “O Poderoso Chefão” (1972), por exemplo, apresenta Michael Corleone, um personagem cuja imperfeição moral é, na verdade, o núcleo da história. Seu desenvolvimento do filho que rejeita a vida criminosa para o chefe implacável da máfia é, paradoxalmente, o que torna sua jornada tão fascinante.
No entanto, essa escolha não se limita a histórias de redenção clássicas. Muitas vezes, a história pode ser mais voltada para a aceitação da falha e a realização de que a busca pela perfeição pode ser uma jornada impossível. Filmes como “O Rei do Show” (2017) exemplificam isso, mostrando que a verdadeira beleza está na imperfeição.
6. Protagonistas Imperfeitos e o Impacto Cultural
Em uma época de crescente conscientização sobre saúde mental, representação e diversidade, os filmes com protagonistas imperfeitos ganham uma nova camada de importância. Eles não só desafiam os estereótipos tradicionais de heróis perfeitos, mas também falam diretamente ao público sobre a aceitação das próprias imperfeições.
Esse tipo de narrativa é mais próximo da experiência cotidiana, onde ninguém é perfeitamente bom o tempo todo, e todos enfrentam lutas internas e externas. Ao ver um personagem imperfeito navegando por essas questões, a audiência sente uma sensação de alívio e conforto. Além disso, esses filmes podem inspirar conversas sobre como melhorar as condições sociais, emocionais e psicológicas dos indivíduos.
7. Exemplos de Protagonistas Imperfeitos no Cinema
Aqui estão alguns exemplos de filmes que utilizaram a imperfeição de seus protagonistas de maneira magistral:
- “Coringa” (2019): Arthur Fleck é um homem marginalizado pela sociedade, cuja falha em se adaptar à realidade se transforma no icônico vilão. O filme aborda sua transformação de um ser humano em sofrimento a uma figura central da cultura pop, enquanto reflete questões de saúde mental e desigualdade social.
- “O Grande Lebowski” (1998): O “Dude” é a personificação do anti-herói imperfeito. Ele vive sem grandes preocupações, mas sua jornada o coloca em situações engraçadas e filosóficas. Ele é desajeitado e sem ambições, mas é adoravelmente real.
- “Breaking Bad” (2008-2013): Walter White é um personagem cujas imperfeições vão de escolhas moralmente questionáveis a falhas pessoais profundas. Sua jornada de transformação de um professor de química em um impiedoso traficante de metanfetamina é fascinante justamente porque explora o impacto das imperfeições humanas.
Conclusão
A escolha de criar protagonistas imperfeitos não é apenas uma tendência cinematográfica, mas uma maneira de refletir sobre a complexidade da vida humana. Esses personagens são mais do que simples heróis ou vilões; eles são espelhos da nossa própria experiência, com todas as falhas, dúvidas e contradições que a vida nos oferece. Ao humanizar seus protagonistas e explorar suas imperfeições, os roteiristas estão criando histórias mais autênticas e emocionantes, capazes de nos cativar, nos fazer refletir e, principalmente, nos conectar.
Filmes com protagonistas imperfeitos não apenas refletem as lutas internas que todos enfrentam, mas também celebram o potencial de crescimento e autodescoberta. E, no final, essa é uma das razões pelas quais essas histórias continuam a ressoar profundamente com o público.